Caranguejo Chama-Maré – Leptuca uruguayensis
Nome em português: Caranguejo Uca, Chama-maré, Caranguejo Violinista
Nome em inglês: Marbled Fiddle Crab
Nome científico: Leptuca uruguayensis (Nobili, 1901)
Origem: Costa atlântica sul da América do Sul
Tamanho: carapaça com largura de 1,4 cm
Temperatura: 15-25° C
Salinidade: tolerante a
variações
Reprodução: primitiva, larvas se desenvolvem no mar
Comportamento: pacífico
Dificuldade: fácil
Os caranguejos chama-marés (também chamados caranguejos-violinistas)
são pequenos
caranguejos semi-terrestres que habitam zonas costeiras, bastante comuns em
manguezais, marismas e estuários. Pouco mais de cem espécies já foram
registradas, até há pouco tempo todas pertenciam ao gênero Uca, divididas em 12 subgêneros.
Porém, em 2016 foi realizada uma cuidadosa revisão da família
Ocypodidae por Shih e colaboradores, baseada em dados moleculares, combinando
informações nucleares (28S rDNA) e mitocondriais (16S rDNA e subunidade I de
citocromo oxidase – COI). Este trabalho trouxe algumas importantes modificações
na sistemática dos chama-marés.
O gênero Uca foi
invalidado, todos os subgêneros passando a ganhar status de gênero. Desta forma, o único chama-maré brasileiro que
mantém o gênero Uca é o U. maracoani, já que pertencia
previamente ao gênero Uca, subgênero Uca. Todos os demais devem ser
designados como Minuca rapax, Leptuca uruguayensis, e assim por
diante. Porém, é provável que os chama-marés continuem sendo chamados
popularmente de "Ucas" por algum tempo.
O antigo gênero Uca
mostrou-se parafilético, pertencendo a dois clados amplamente divergentes. Desta
forma, a família Ocypodidae passa a ser classificada da seguinte forma: O
antigo subgênero Uca (e um gênero
africano) agrupam-se com os caranguejos maria-farinha (Ocypode), constituindo a subfamília Ocypodinae. Todos os demais
chama-marés conhecidos são monofiléticos (inclui as demais nove espécies
brasileiras), e agrupam-se na subfamília Gelasiminae. Os Uçás (Ucides) voltam a pertencer a Ocypodidae,
constituindo a terceira subfamília, Ucidinae.
Outras informações gerais dos chama-marés podem ser vistas nos
dois textos introdutórios
presentes na seção "artigos" . Sugerimos a sua leitura previamente
à desta ficha.
Apresentação
O Leptuca uruguayensis
é a espécie brasileira de chama-maré com
distribuição mais meridional, mais adaptada a climas frios. Assim como os
outros dois pequenos Leptuca, é uma espécie pequena
e delicada, com uma belíssima coloração vermelha nas pernas e garras.
Esporadicamente é vista à venda nas lojas de aquarismo.
Etimologia: Leptuca vem do grego leptos (pequeno,
delicado) e Uca, o nome original do gênero dos chama-marés. Uca tem uma
etimologia bem interessante, explicada no artigo principal. E uruguayensis significa
originário do Uruguai.
Colônia de Leptuca uruguayensis, fotografado em um mangue próximo ao Aeroporto do Galeão, Ilha do Governador, Rio de Janeiro, próximo ao limite norte da distribuição desta espécie. São na maioria animais com padrão de cor pré-alvejamento. Na terceira foto, pode ser visto um caranguejo parcialmente alvejado, ao fundo. Fotos gentilmente cedidas por Fábio Lima Ferreira.
Leptuca uruguayensis,
macho em coloração reprodutiva, realizando movimentos de exibição com sua quela. Fotografado no manguezal do Rio Escuro, Ubatuba, SP. Fotos de Walther Ishikawa.
Leptuca uruguayensis macho, mostrando sua típica coloração reprodutiva, alvejamento parcial e membros de intenso vermelho. Fotografado em Guaratiba, RJ, foto de Walther Ishikawa.
Distribuição geográfica de Leptuca uruguayensis. Imagem
original Google Maps; dados de Melo GAS 1996.
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Origem e habitat
É
uma espécie com distribuição geográfica mais restrita, encontrada somente na
região sul e sudeste da América
do Sul, na sua costa atlântica. Habitam climas subtropicais e
temperados, ocorrendo desde o Rio de Janeiro, Uruguai até Argentina (RJ a RS no Brasil). A população de Mar Chiquita, Provincia Buenos Aires, Argentina é a colônia mais localizada ao sul de caranguejos chama-maré do mundo.
Seu
habitat típico é nas proximidades de manguezais no Brasil, em estuários, e
marismas argentinos, em terreno lodoso-arenoso ou lodoso, rico em matéria
orgânica. Ocorre em locais abertos, expostos ao sol, ou parcialmente abrigados.
É uma espécie eurihalina, adaptando-se a diferentes salinidades.
O Leptuca uruguayensis
mostra uma surpreendente plasticidade em se tratando de nichos ambientais ocupados,
a depender da presença ou não de espécies congêneres.
Ao norte de Florianópolis (SC), o L. uruguayensis co-habita com o M. rapax e L. leptodactyla os substratos arenosos da zona entre-marés, onde
ele está limitado às áreas sombreadas mesosalinos a eusalinos. Porém, ao sul de
Florianópolis, onde é a única espécie de chama-maré,
o L. uruguayensis ocupa diversos
habitats, desde substratos lodosos, lamacentos a puramente arenoso, e de
oligosalinos a hipersalinos, constituindo uma espécie oportunista que ocupa
nichos vagos pelas espécies mais tropicais e subtropicais.
Aparentemente, quando as pressões de competição interespécies
relaxam, o L. uruguayensis se expande
para um habitat menos favorável, e sobrevive. Quando confrontado por congêneres
de uma latitude mais elevada, o L.
uruguayensis seleciona uma espectro mais estreito de características
ambientais que ocupa com uma eficiência alimentar e osmoregulatória maior.
Um marisma na Reserva Natural de Punta Rasa, em San Clemente
del Tuyú (Argentina). Colônia de Leptuca uruguayensis. No local, haviam também numerosos Neohelice granulata. Fotos gentilmente cedidas pelo aquarista argentino Hernán
Chinellato.
Aparência
Assim como os dois outros típicos pequenos Leptuca brasileiros, o Leptuca uruguayensis é um pequeno e delicado chama-maré com carapaça semi-cilíndrica. Possui fronte um pouco mais estreita do que as duas outras espécies. Machos podem ser distinguidos do Leptuca leptodactyla pelo formato da garra, e geralmente a distinção do Leptuca cumulanta é fácil pelo formato da borda da carapaça, fusão de segmentos abdominais, coloração e local de coleta.
O Leptuca leptodactyla e o L. uruguayensis são as únicas
espécies brasileiras que apresentam uma intensa mudança de coloração durante a exibição sexual. No Leptuca uruguayensis o “alvejamento” (“whitening”)
também é intenso, pode ocorrer somente na carapaça, ou se estender para a garra
maior do macho. É precedida por uma fase com carapaça verde, e um intenso
vermelho ou vermelho-alaranjado na garra e pernas.
Leptuca uruguayensis,
macho, fotografado em São Francisco do
Sul, Santa Catarina. No local, eram simpátricos com Leptuca leptodactyla. Foto cedida por
César Arzua, assim como a primeira imagem deste artigo.
Leptuca uruguayensis,
macho em coloração reprodutiva, fotografado na Marisma
da Barra, Estuário da Lagoa dos Patos, Rio Grande (RS). Foto cedida por André Colling.
Leptuca uruguayensis,
macho em coloração reprodutiva, fotografado no manguezal do Rio Escuro, Ubatuba, SP. Fotos de Walther Ishikawa.
Peculiaridades na manutenção em aquaterrários
O Leptuca uruguayensis é eventualmente vista á venda no comércio de
animais, por ser uma espécie com belo colorido, e relativamente adaptável a
menores salinidades. Porém, não vive bem a longo prazo em água doce, morrendo
em questão de semanas ou meses. Dadas as condições adequadas, pode ser criada
com sucesso em paludários salobros.
Leptuca uruguayensis,
comprado em uma loja de aquários, em São Paulo, SP. Foto cedida por
Rodrigo Machini.
Bibliografia:
- Melo GAS. Manual de
Identificação dos Brachyura (caranguejos e siris) do litoral brasileiro. São Paulo:
Plêiade/FAPESP Ed., 1996, 604p.
- Crane J. 1975. Fiddler crabs of the world. Ocypodidae: Genus Uca. New Jersey: Princepton University
Press, 736p.
- Thurman CL, Faria SC, McNamara
JC. The distribution of fiddler crabs (Uca)
along the coast of Brazil: implications for biogeography of the western
Atlantic Ocean. Marine Biodiversity
Records 01/2013; 6:1-21.
- Bezerra LEA. The fiddler crabs
(Crustacea: Brachyura: Ocypodidae: genus Uca)
of the South Atlantic Ocean. Nauplius
2012; 20(2): 203-246.
- Koch V, Wolff M, Diele K. Comparative population dynamics of four
fiddler crabs (Ocypodidae, genus Uca) from a North Brazilian mangrove
ecosystem. Marine ecology.
2005, vol. 291, pp. 177-188.
- Masunari S. Distribuição e
abundância dos caranguejos Uca Leach (Crustacea, Decapoda, Ocypodidae) na Baía
de Guaratuba, Paraná, Brasil. Rev. Bras. Zool. 2006, vol.23, n.4, pp. 901-914.
- Bede LM, Oshiro LMY, Mendes
LMD, Silva AA.. Comparação da estrutura populacional das espécies de Uca
(Crustacea: Decapoda: Ocypodidae) no Manguezal de Itacuruçá, Rio de Janeiro,
Brasil. Rev. Bras. Zool. 2008, vol.25, n.4 pp. 601-607.
- Shih HT, Ng PKL, Davie PJF,
Schubart CD, Türkay M, Naderloo R, Jones D, Liu MY. 2016. Systematics of the
family Ocypodidae Rafinesque, 1815 (Crustacea: Brachyura), based on phylogenetic
relationships, with a reorganization of subfamily rankings and a review of the
taxonomic status of Uca Leach, 1814,
sensu lato and its subgenera. The Raffles
Bulletin of Zoology, 64:139-175.
Agradecimentos especiais a Fábio Lima Ferreira, Hernán Chinellato, Rodrigo Machini, César Arzua e Dr. André Colling (Instituto de Oceanografia - FURG) pela cessão das fotos para o artigo. Somos muito
gratos também à ecóloga Ravena Sthefany Alves Nogueira por valiosas
informações sobre a taxonomia destes animais.
As fotografias
de Walther Ishikawa estão licenciados sob
uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos
respectivos autores.
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