INÍCIO ARTIGOS ESPÉCIES GALERIA SOBRE EQUIPE PARCEIROS CONTATO
 
 
    Espécies
 
"Minuca panema"  
Artigo publicado em 03/07/2012, última edição em 12/12/2023  



Caranguejo Chama-MaréMinuca panema


Nome em português: Caranguejo Uca, Chama-maré, Caranguejo Violinista
Nome em inglês:
Saltpan Fiddler Crab, Burgers´ Fiddler Crab
Nome científico: Minuca panema (Coelho, 1972)
Origem:
Costa tropical e subtropical atlântica da América do Sul
Tamanho: carapaça com largura de 2,0 cm
Temperatura: 20-28° C
Salinidade:
tolerante a variações
Reprodução: primitiva, larvas se desenvolvem no mar
Comportamento: pacífico
Dificuldade: fácil


Os caranguejos chama-marés (também chamados caranguejos-violinistas) são pequenos caranguejos semi-terrestres que habitam zonas costeiras, bastante comuns em manguezais, marismas e estuários. Pouco mais de cem espécies já foram registradas, até há pouco tempo todas pertenciam ao gênero Uca, divididas em 12 subgêneros.

Porém, em 2016 foi realizada uma cuidadosa revisão da família Ocypodidae por Shih e colaboradores, baseada em dados moleculares, combinando informações nucleares (28S rDNA) e mitocondriais (16S rDNA e subunidade I de citocromo oxidase – COI). Este trabalho trouxe algumas importantes modificações na sistemática dos chama-marés.

O gênero Uca foi invalidado, todos os subgêneros passando a ganhar status de gênero. Desta forma, o único chama-maré brasileiro que mantém o gênero Uca é o U. maracoani, já que pertencia previamente ao gênero Uca, subgênero Uca. Todos os demais devem ser designados como Minuca rapax, Leptuca uruguayensis, e assim por diante. Porém, é provável que os chama-marés continuem sendo chamados popularmente de "Ucas" por algum tempo.

O antigo gênero Uca mostrou-se parafilético, pertencendo a dois clados amplamente divergentes. Desta forma, a família Ocypodidae passa a ser classificada da seguinte forma: O antigo subgênero Uca (e um gênero africano) agrupam-se com os caranguejos maria-farinha (Ocypode), constituindo a subfamília Ocypodinae. Todos os demais chama-marés conhecidos são monofiléticos (inclui as demais nove espécies brasileiras), e agrupam-se na subfamília Gelasiminae. Os Uçás (Ucides) voltam a pertencer a Ocypodidae, constituindo a terceira subfamília, Ucidinae.

Outras informações gerais dos chama-marés podem ser vistas nos dois textos introdutórios presentes na seção  "artigos" . Sugerimos a sua leitura previamente à desta ficha.


A espécie abordada neste artigo era chamada de Minuca burgersi (Holthuis, 1967), supostamente uma espécie de ampla distribuição, sendo encontrada na costa atlântica americana desde a Flórida (EUA) até o Sul do Brasil. Porém, estudos publicados em 2021 e 2023, que incluíam análises moleculares, demonstraram que trata-se de três espécies distintas, e que o verdadeiro Minuca burgersi era uma espécie caribenha. A espécie encontrada na costa brasileira foi considerada Minuca panema, na realidade uma espécie re-validada. 



Apresentação

O Minuca panema é a menor espécie dentre os Minucas brasileiros, pode medir até 2 cm de largura da carapaça, mas geralmente é menor. Comumente mostra uma bela padronagem de pequenas manchas na carapaça, brancas sobre um fundo cinza azulado, daí seu nome em inglês, “saltpan” (“salinas”), remetendo a cristais de sal branco em locais onde a água do mar evapora. A região posterior da carapaça tem cor vermelho-cereja a marrom. Quelas amarelo-alaranjadas. É uma espécie que pode ser eventualmente encontrada à venda nas lojas de animais.

Etimologia: Minuca vem do latim minus (pouco, pequeno) e Uca, o nome original do gênero dos chama-marés. Uca tem uma etimologia bem interessante, explicada no artigo principal. panema é uma homenagem à designação popular original da espécie, descrita por Marcgrave (1648), "ciecie panema".




Minuca panema macho, fotografado em Peruíbe, São Paulo. Note o mero do último par de pernas bastante longo e fino, típico desta espécie. Fotos de Walther Ishikawa.


Distribuição geográfica de Minuca panema. Imagem original Google Maps; dados de Melo GAS 1996 e demais referências.



Origem e habitat

            É uma espécie com ampla distribuição geográfica, em climas tropicais, subtropicais e temperadas da América do Sul, na sua costa atlântica. Entretanto, mostra uma distribuição disjunta, são encontradas em Trinidad, e volta a ser encontrado no Brasil, mas a partir de Maranhão (MA a SC).

            É uma espécie adaptável, resistente a variadas salinidades, pode ser encontrado em diversos habitats, mas mostra preferência a salinidades médias a baixas. É uma espécie comum em praias de estuários e lagoas costais, e entre manguezais. Prefere substratos arenosos e areno-lodosos, pobre em matéria orgânica, e sem vegetação. Constroem suas tocas em local seco, acima da linha da maré.

            Esta preferência de substrato explica sua distribuição disjunta, não é encontrado junto à foz do Rio Amazonas porque neste habitat o terreno é bastante lamacento, devido ao sedimento fino trazido pelo rio. Existe um único e questionável relato de coleta, antigo, no PA.

            Possuem ovos maiores do que de outras espécies de chama-marés (350 micrômetros), alguns autores sugerem que esta espécie se reproduza em água salobra, ao invés do oceano.


 









Minuca panema macho, fotografado em Peruíbe, São Paulo. Note a fronte bastante larga, típica de um Minuca. na segunda foto também é bem visível a crista proximal de tubérculos junto à base do dedo móvel, divergente ao sulco articular adjacente. Fotos de Walther Ishikawa.





Aparência

 

O Minuca panema é uma das cinco espécies brasileiras de Minuca, com fronte bem larga, e muitas vezes a diferenciação destas outras espécies pode ser bastante difícil (veja o artigo sobre identificação  aqui  ). Algumas características típicas desta espécie são: o aspecto longo, reto e fino do mero da última perna ambulatória; face interna da quela maior do macho, crista proximal de tubérculos junto à base do dedo móvel, divergente em relação ao sulco articular adjacente.

O Minuca panema mostra uma mudança muito discreta na sua coloração para exibição, sem tons de branco. Sua carapaça é marrom escura, com manchas brilhantes vermelhas ou cor-de-rosa. Eventualmente toda carapaça pode ter uma cor brilhante, tanto em machos quanto fêmeas. A garra maior do macho é avermelhada (desde vermelho brilhante, rosa claro ou rosa alaranjado), em geral com a região da palma acinzentada, e dedos brancos. As pernas são de cor marrom, podendo ter faixas cinza, e eventualmente a cor rosada da carapaça pode se estender para a base do mero.




Minuca panema macho, coletado em Peruíbe, São Paulo. Close na face interna da quela maior do macho, mostrando o aspecto típico desta espécie. Além da crista proximal de tubérculos junto ao dedo móvel, note o aspecto tuberculado da região central da palma, um sinal bastante útil na diferenciação do Minuca mordax. Foto de Walther Ishikawa.

 


Minuca aff. burgersi macho, fotografado na Flórida, EUA. Foto de Chris Lukhaup.





Fêmeas de Minuca panema, fotografado em Caraguatatuba, São Paulo. Fotos de Walther Ishikawa.




Minuca panema, este caranguejo foi predado por um Goniopsis cruentata, no detalhe pode ser visto o animal mutilado. Foi criado em um pequeno aquário-hospital até a regeneração dos seus membros. Na foto principal, o animal pouco após a ecdise, a exúvia pode ser vista ao fundo. Fotos de Walther Ishikawa.



Peculiaridades na manutenção em aquaterrários

O Minuca panema é uma espécie comum de ser encontrada, tanto na natureza, quanto em lojas de aquários. Resistente, é vendido como sendo um animal aquático, e de água doce. Infelizmente sua expectativa de vida é bastante reduzida nestas condições, não sobrevivendo por mais do que semanas a meses.


 



Casal de Minuca panema, comprado em uma loja de aquários em São Paulo, SP. Fotos de Sérgio K. Saruwataru.







Minuca panema em um paludário salobro. Foto de Walther Ishikawa.


 

 

 

Bibliografia:

  • Melo GAS. Manual de Identificação dos Brachyura (caranguejos e siris) do litoral brasileiro. São Paulo: Plêiade/FAPESP Ed., 1996, 604p.
  • Crane J. 1975. Fiddler crabs of the world. Ocypodidae: Genus Uca. New Jersey: Princepton University Press, 736p.
  • Thurman CL, Faria SC, McNamara JC. The distribution of fiddler crabs (Uca) along the coast of Brazil: implications for biogeography of the western Atlantic Ocean. Marine Biodiversity Records 01/2013; 6:1-21.
  • Bezerra LEA. The fiddler crabs (Crustacea: Brachyura: Ocypodidae: genus Uca) of the South Atlantic Ocean. Nauplius 2012; 20(2): 203-246.
  • Castiglioni DS, Almeida AO, Bezerra LEA. More common than reported: range extension, size–frequency and sex-ratio of Uca (Minuca) victoriana (Crustacea: Ocypodidae) in tropical mangroves, Brazil. Marine Biodiversity Records, 06 January 2011 3: e94 (8 pages).
  • Benetti AS. 2007. Biologia reprodutiva em espécies do gênero Uca (Crustacea, Brachyura,Ocypodidae) em manguezais tropicais. Tese de Doutorado, Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP.
  • Benedetto MD. 2007. Biologia de Uca maracoani Latreille, 1802-1803 (Decapoda, Brachyura, Ocypodidae) no Baixio Mirim, Baía de Guaratuba, Paraná, Brasil. Tese de Mestrado, Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR.
  • Koch V, Wolff M, Diele K. Comparative population dynamics of four fiddler crabs (Ocypodidae, genus Uca) from a North Brazilian mangrove ecosystem. Marine ecology. 2005, vol. 291, pp. 177-188.
  • Masunari S. Distribuição e abundância dos caranguejos Uca Leach (Crustacea, Decapoda, Ocypodidae) na Baía de Guaratuba, Paraná, Brasil. Rev. Bras. Zool. 2006, vol.23, n.4, pp. 901-914.
  • Bede LM, Oshiro LMY, Mendes LMD, Silva AA.. Comparação da estrutura populacional das espécies de Uca (Crustacea: Decapoda: Ocypodidae) no Manguezal de Itacuruçá, Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Zool. 2008, vol.25, n.4 pp. 601-607.
  • Gibbs PE. Notes on Uca burgersi Holthuis (Decapoda, Ocypodidae) from Barbuda, Leeward Islands. Crustaceana. Vol. 27, No. 1 (Jul., 1974), pp. 84-91.
  • Thurman C. Osmoregulation in fiddler crabs (Uca) from temperate Atlantic and Gulf of Mexico coasts of North America. Marine Biology. Volume 142, Number 1, 77-92.
  • Oliveira LPH. Alguns fatores que limitam o habitat de varias especies de caranguejos do genero Uca Leach: (Decapoda: Ocypodidae). Mem. Inst. Oswaldo Cruz. 1939, vol.34, n.4, pp. 519-526.
  • http://www.sms.si.edu/
  • Shih HT, Ng PKL, Davie PJF, Schubart CD, Türkay M, Naderloo R, Jones D, Liu MY. 2016. Systematics of the family Ocypodidae Rafinesque, 1815 (Crustacea: Brachyura), based on phylogenetic relationships, with a reorganization of subfamily rankings and a review of the taxonomic status of Uca Leach, 1814, sensu lato and its subgenera. The Raffles Bulletin of Zoology, 64:139-175.
  • Thurman CL, Alber RE, Hopkins MJ, Shih H-T. 2021. Morphological and genetic variation among populations of the fiddler crab Minuca burgersi (Holthuis, 1967) (Crustacea: Brachyura: Ocypodidae) from shores of the Caribbean Basin and South Atlantic Ocean. Zool Stud 60:19.
  • Thurman CL, Shih HT, McNamara JC. Minuca panema (Coelho, 1972): Resurrection of a Fiddler Crab Species from Brazil Closely Related to Minuca burgersi (Holthuis, 1967) (Crustacea, Decapoda, Brachyura, Ocypodidae). Zool Stud. 2023 Sep 13;62:e45.




Agradecimentos ao colega Sérgio K. Saruwataru pela cessão das suas fotos para o artigo. Somos muito gratos também à ecóloga Ravena Sthefany Alves Nogueira por valiosas informações sobre a taxonomia destes animais.


As fotografias de Walther Ishikawa estão licenciados sob uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seu "copyright" pertencendo aos respectivos autores.
 
« Voltar  
 

Planeta Invertebrados Brasil - © 2024 Todos os direitos reservados

Desenvolvimento de sites: GV8 SITES & SISTEMAS