Aratu vermelho –
Goniopsis cruentata
Nome em
português: Aratu vermelho, Maria-mulata
Nome em inglês:
Red mangrove-root crab, Red devil’s crab
Nome científico: Goniopsis
cruentata (Latreille, 1803)
Origem:
Américas, costa atlântica e pequeno foco pacífico, costa atlântica africana
Tamanho: carapaça com largura de 6,0 cm
Temperatura: 20-28° C
Salinidade: tolerante a variações,
prefere alta
Reprodução: primitiva, necessita
de água salobra para as larvas
Comportamento: agressivo
Dificuldade: fácil
Apresentação
Aratu é o nome popular de
diversos caranguejos semi-terrestres do mangue, principalmente da família dos
sesarmídeos. Destas, a mais importante é o Goniopsis
cruentata, comestível, que muitas vezes é chamado simplesmente de “Aratu”.
Possui diversos nomes populares regionais, “Aratu vermelho”, “Aratu
vermelho-preto”, Aratu do mangue”, “Maria-mulata”, “Carapinha”, “Espia-moça”, “Túnica”, “Anajá”, “Bonitinho”,
etc.
O Goniopsis
é um gênero grapsídeo com três espécies válidas, o G. cruentata é a
única que apresenta uma distribuição atlântica. O G. pelii (Herklots,
1851) ocorre na costa oeste africana, e o G. pulchara (Lockington, 1876)
é encontrado no pacífico americano.
O Aratu-vermelho é uma importante
espécie comestível, sendo bastante explorada artesanalmente nos estados do
Nordeste, em especial em Pernambuco. Ali, a produção de Aratu atingiu em 2004 o
volume de 71,5 toneladas (IBAMA/CEPENE). Apesar da sua importância, não
há portaria para sua proteção, ao contrário do Uçá e Guaiamum. O caranguejo é
cozido, ou vendido inteiro, ou sua carne extraída, chamado de “catado”.
A captura do Goniopsis é feita por
um artefato artesanal formado por vara, linha e isca. Os tipos de isca
utilizados são tripa de galinha, carne de charque e a carne do caranguejo Aratus pisonii. Durante a pesca, as catadoras lançam a isca (presa à
extremidade da linha) para a superfície do substrato. Em seguida, o Aratu
utiliza o quelípodo para recolher a isca, de modo que fica preso ao anzol, e é
rapidamente lançado para um saco. É uma atividade tipicamente feminina,
com canções tradicionais entoadas durante a captura, para atrair o caranguejo. As
catadoras também retiram
alguns galhos do mangue e passam a percuti-los em recipientes de plástico ou
metal, assobiando simultaneamente, com objetivo de atrair os Aratus.
Etimologia: Goniopsis vem do grego gōnia (ângulo)
e opsis (aparência, semelhança,
visão), algo como “com aspecto angulado”, pela morfologia da sua carapaça; cruentata vem do latim cruentus (sanguinolento), devido à sua
coloração.
Aratu vermelho, animais coletados para alimentação. Fotografado em Mangue Seco, BA. Foto cedida por Rita Ribeiro.
Aratu vermelho, fotografado em um mangue na Baía de Guaratuba, PR. Fotos cedidas por Carlos A. P. Parchen. A primeira imagem do artigo também é de sua autoria.
Distribuição geográfica de Goniopsis cruentata. Imagem
original Google Maps; dados de Melo GAS 1996 e demais referências.
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Origem e habitat
Ampla distribuição geográfica,
extensa no Atlântico ocidental, do sul da Flórida (EUA) até Santa Catarina, sul
do Brasil. Ilhas de Fernando de Noronha e Atol das Rocas. No Atlântico
oriental, do Senegal a Angola. É encontrado também na costa pacífica do Panamá.
Habita áreas estuarinas das zonas
tropicais e subtropicais, predominando no supra e médio-litoral, permanecendo
boa parte do tempo emerso. Poderosos osmorreguladores, eles ocupam habitats de
salinidades diversas, mas preferem ambientes mais salinos, com valores de 22 a
35%o.
Versátil, ocupa praticamente
todos os microhabitats do mangue, desde o solo lamoso e arenoso entre raízes e
troncos das árvores do manguezal, até as próprias árvores, sendo considerado
semi-arborícola. Não constroem tocas, invadindo habitações de outros
caranguejos no solo.
Goniopsis cruentata, fotografado em Guarujá, SP. Foto de Ana Pitteri.
Aparência
São caranguejos achatados de porte médio, carapaça quadrada, um pouco
mais larga do que comprida, e pernas dispostas lateralmente. Olhos nas bordas
ântero-laterais da carapaça, pedunculados mas curtos. Margem ântero-lateral com
um único dente. Mero dos quelípodos com margem interna expandida em larga
lâmina com margem espinhosa ou dentada. Adultos têm uma coloração bem
característica, mas juvenis podem ser confundidos com os de outras espécies de
Aratus (Sesarma, Armases e Aratus).
Possui uma belíssima coloração e padronagem, com carapaça avermelhada,
arroxeada ou marrom-escura, pernas
avermelhadas com pintas brancas ou alaranjadas, região ventral clara. As pernas
possuem longas cerdas e pelos.
Goniopsis cruentata juvenil, fotografado em Peruíbe, SP. Fotos de Walther Ishikawa.
Uma grande exúvia, também fotografado em Peruíbe, SP. Fotos de Walther Ishikawa.
Dimorfismo Sexual
Como quase todos os caranguejos,
a distinção pode ser feita facilmente através da análise do abdômen, que fica
dobrado sobre a porção ventral da carapaça. Fêmeas possuem o abdômen largo,
onde incubam seus ovos. Nos machos, o abdômen é estreito.
Machos adultos também possuem
garras maiores e mais robustas.
Aratu vermelho, fotografado em um estuário
de um grande rio em Aquiraz, Ceará. Foto de
Walther Ishikawa.
Reprodução
Seu ciclo de vida é muito
semelhante ao de outros crustáceos semi-terrestres estuarinos. Durante a
estação reprodutiva, estes caranguejos lançam milhares de larvas na água
durante a maré cheia. Estas são levadas pela correnteza até o mar, onde completam
seu desenvolvimento, até retornarem para o estuário.
Reproduz-se continuamente ao
longo do ano, exceto nos meses mais frios, em climas temperados. Pode realizar
desovas múltiplas.
Apesar da sua importância, os
dados sobre a reprodução desta espécie são incompletos, o seu desenvolvimento
larvar não foi totalmente estudado em laboratório. Sabe-se que é um animal com
um padrão primitivo de reprodução, com ovos bem pequenos (0.3 mm) e numerosos,
podendo chegar a 171.000 ovos. O período de incubação é de cerca de 18 dias. Os
zoea I nascem com 0.9 mm, e passam
por pelo menos três estágios de zoea
durante seu desenvolvimento. Necessita de altas salinidades, próxima à marinha
(33%o).
Aratu vermelho, fotografado no Parque Estadula da Ilha do Cardoso (PEIC), em Cananéia, SP. Fotos de André Benedito.
Comportamento
São animais agressivos, onívoros, parte da
sua alimentação é baseada na predação de caranguejos menores, como Uca e Aratus. Desta forma, não é recomendável sua manutenção com outros
caranguejos, especialmente de menor tamanho. Bastante ativos tanto de dia
quanto de noite. Rápidos e ágeis, são bem difíceis de serem capturados.
Goniopsis cruentata, fêmea ovada fotografada no manguezal do Rio Cavalo, em Itamambuca, Ubatuba (SP). Fotos de Walther Ishikawa.
Alimentação
Onívoros, alimenta-se desde folhas de
mangue a cadáveres de crustáceos, incluindo-se os da própria espécie. Ingerem propágulos
de diversas espécies de árvores do mangue, influenciando sua distribuição. G. cruentata é um
grande predador dos manguezais, caçando ativamente espécies menores de
caranguejos, especialmente as diversas espécies de Uca, e o Aratus pisonii. Porém, análise de conteúdos estomacais mostram que, apesar de onívoro e predador, uma grande quantidade de sedimento foi encontrado no estômago, indicando que, em termos de volume, detritos representam o componente principal da sua dieta. Entretanto, mostrou também uma varieade muito maior de alimentos do que outros caranguejos de manguezais, confirmando seu caráter oportunista e generalista.
Em cativeiro, necessitam de um balanço
adequado entre Fósforo e Cálcio, com predomínio deste último. Muitos criadores
fornecem suplementos de cálcio, como alimentos para répteis e comprimidos
mastigáveis de uso humano. É conveniente também evitar um excesso de proteínas
na dieta, mantendo uma dieta básica de vegetais. Outros alimentos não recomendados
são o espinafre (rico em ácido oxálico) e salsinha (alto teor de ácido
prússico, bastante tóxico para os caranguejos).
Goniopsis cruentata, fotografado no manguezal de São Francisco do Sul, SC. Foto cedida por Germano
Woehl Jr. (Instituto Rã-bugio para Conservação da Biodiversidade).
Manutenção em
Aquaterrários
É uma espécie semi-terrestre, necessitando
uma área seca predominante, e uma área aquática. Embora tolerem uma ampla faixa
de salinidade, necessitam de água salobra para uma manutenção saudável. É uma espécie agressiva, e relatos de predação são comuns, especialmente com animais menores.
Pelo seu hábito de escalar
objetos, é aconselhável que haja pedras, troncos e outros objetos no terrário. São exímios escaladores, o tanque deve ser
sempre mantido bem tampado, para evitar fugas. Pelo mesmo motivo, deve-se
atentar a troncos e outros objetos que possam ser usados como apoio pelos
animais para fugas. Consegue escalar até os cabos elétricos de filtros, uma
sugestão é ocluir bem qualquer pequena fresta na tampa do paludário por onde
estes fios adentram o tanque, por exemplo, com massas ou papel alumínio.
Caranguejos coletados em um estuário em São Sebastião, SP. Acima à esquerda, dois Uca burgersi. Acima à direita, dois Armases angustipes acima e Uca leptodactyla abaixo. O pequeno caranguejo abaixo à esquerda é um Goniopsis cruentata
juvenil, coletado por engano (pensou-se que se tratava de outra espécie, como um Armases). Foto de Walther Ishikawa.
Goniopsis cruentata, o mesmo animal da foto acima, criado em um paludário salobro por alguns meses. na primeira foto, o animal ainda pequeno, na última foto, após cerca de 6 meses. O caranguejo foi separado dos demais animais devido à sua agressividade. Foto de Walther Ishikawa.
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on the Brazilian coast. (2011) Crustaceana
84 (5-6): 735-747.
Agradecimentos aos colegas Carlos A. P. Parchen, Rita Ribeiro, Ana Pitteri, André Benedito e Germano Woehl Jr. ( Instituto Rã-bugio para Conservação da Biodiversidade ), pela cessão das fotos para o artigo.
As fotografias
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