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"Mikrotrich. borellianus"  
Artigo publicado em 17/03/2012, última edição em 17/01/2024  




Caranguejo de Água Doce – Mikrotrichodactylus borellianus

Nome em português: Caranguejo de água doce, Caranguejo-anão.
Nome em inglês: -
Nome científicoMikrotrichodactylus borellianus (Nobili, 1896)

Origem: América do Sul
Tamanho: carapaça com largura de até 2,5 cm
Temperatura: 20-28° C
pH: neutra para alcalina

Dureza: moderadamente dura
Reprodução
: especializada, todo ciclo de vida em água doce
Comportamento: pacífico
Dificuldade: fácil

 

 

Apresentação

 

O Mikrotrichodactylus borellianus é um pequeno caranguejo dulcícola aquático, de hábitos noturnos. Bastante comuns em riachos argentinos e paraguaios, é criado por aquaristas destes países há algum tempo. São mais raros no Brasil, sendo encontrados na região do Pantanal matogrossense, e alguns riachos dos estados do Sul.

Até muito recentemente, estes pequenos caranguejos eram classificados juntamente com os Trichodactylus. Há muito tempo alguns autores defendiam a classificação deste e de outros pequenos Trichodactylus como um grupo taxonômico distinto, baseado em uma série de detalhes anatômicos peculiares, no gênero Mikrotrichodactylus.

           Publicado em 2013 e 2018, a Dra. Edvanda Andrade Souza de Carvalho realizou um interessante trabalho nas suas teses de mestrado e doutorado, realizando análises morfológicas e genéticas (16S e COI) em um grande número de espécimes de Trichodactylus, com alguns resultados bastante interessantes. 146 espécimes foram analisados morfologicamente, e 43 geneticamente. Este trabalho demonstrou a validade dos Mikrotrichodactylus, que formavam um clado bem definido, e com distância significativa dos grandes Trichodactylus.


            Etimologia: Mikrotrichodactylus vem do grego mikro (pequeno), thríks (cabelo) e daktulos (dedo); borellianus é em homenagem ao naturalista francês de família italiana Alfredo Borelli (1857-1943).

 

Origem

            Espécie sul-americana, com distribuição mais restrita no Brasil (estados do Pará, São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), Bolívia, Paraguai e Argentina. Habitam especialmente as bacias do Sul, dos rios Paraná e Paraguai. Pequenos focos de ocorrência também na Bacia Amazônica.

            Em 2013, foram-me cedidos alguns exemplares coletados em um pesqueiro em Valinhos, SP, o qual visitei pessoalmente depois. Trata-se de uma ampliação da área de ocorrência desta espécie, possível introdução exótica. Os exemplares fotografados no Paraná (próximo à divisa com o Paraguai) também são de uma área sem relatos oficiais deste caranguejo. 

Vivem em lagoas rasas, córregos e rios. São bem comuns em meio à vegetação aquática destes locais, principalmente folhas e raízes de Aguapé (Eicchornia), e também em meio às folhas mortas depositadas ao fundo. São coletados ainda em fendas e buracos de troncos e outros objetos, submersos ou emersos próximo ao nível da água.

 


Distribuição geográfica de Mikrotrichodactylus borellianus. Imagem original Google Maps; dados de Magalhães C. In: Melo GAS. 2003, e demais referências.


Aparência

 

Cefalotórax de altura média a baixa, de forma arredondada, superfície irregular. Região frontal plana. Olhos pequenos, antenas curtas. Quelípodos de tamanho médio, maiores e assimétricos nos machos. Pernas dispostas lateralmente. Geralmente de cor acastanhada ou esverdeada clara. Costumam ter finas cerdas na carapaça e pernas.

Segmentos abdominais sem fusão, em ambos os sexos. O padrão de dentes na carapaça é típico, e auxilia bastante sua identificação. Têm dois dentes pequenos ou vestigiais na margem anterior, seguido de três dentes triangulares grandes, sendo o primeiro dente grande situado medianamente, e os outros dois na margem posterior.

 


Mikrotrichodactylus borellianus, animal coletado no Rio Paraná, Argentina. Imagem cedida por Valeria Castagnino.




Mikrotrichodactylus borellianus, macho em aquário. Note a acentuada heteroquelia. Imagem cedida por Valeria Castagnino.




Pequena fêmea, o padrão de dentes na carapaça é bem visível nesta imagem. Note os dentes médio-posteriores maiores do que os anteriores. Imagem cedida por Valeria Castagnino.


Parâmetros de Água

 

Baseados nos sítios de coleta, os parâmetros de água incluem um pH por volta de 7,0 a 8,0, água moderadamente dura e temperatura entre 20 e 28° C. Segundo alguns aquaristas, o sucesso na criação é maior em águas um pouco mais aquecidas (entre 26 e 32º C), com substrato arenoso e suplementação de Carbonato de Cálcio.

 



Mikrotrichodactylus borellianus, coletado em um pesqueiro em Valinhos, SP. Na primeira foto, um macho em imagem ventral. Na última imagem, podem ser vistos também dois Trichodactylus fluviatilis. Fotos de Walther Ishikawa.


Dimorfismo Sexual

 

Como todo caranguejo, pode ser feita facilmente através da análise do abdômen, o macho possui abdômen estreito, e a fêmea, abdômen largo, onde fixa seus ovos. Machos adultos também possuem garras maiores e mais robustas, uma delas mais desenvolvida (heteroquelia).

Machos são maiores, atingindo até 2,5 cm de largura de carapaça. As fêmeas medem até 1,5 cm.



Um casal de Mikrotrichodactylus borellianus, a fêmea acima, e o macho abaixo, animais do Paraná. Imagens cedidas por Leonardo N. Scherer.


Reprodução

Todo seu ciclo de vida se dá em água doce. Fêmeas ovígeras são encontradas principalmente no final do inverno, embora se reproduzam ao longo de todo o ano. A maturidade sexual das fêmeas se dá com largura da carapaça de cerca de 7 mm.

A corte e cópula são curtas e agressivas, e submersas. O macho toma a iniciativa, e segura a fêmea com suas garras, a qual rebaixa seu pleon abdominal, os dois animais ficando ventre a ventre, com o macho em cima. Este abraço nupcial dura de 50 a 90 minutos. Terminada a transferência de sêmen, o macho rapidamente libera a fêmea. 

Logo antes da fêmea depositar os ovos no abdômen, esta abandona a água, a desova sendo via de regra emersa. Permanecem fora d´água por pelo menos algumas horas após a desova. Enquanto carregam os ovos, as fêmeas preferem ficar emersas (quase o dobro do tempo em relação à submersão), em algum local onde a água não cubra o abdômen. Produzem ovos de grandes dimensões, apresentam desenvolvimento pós-embrionário direto, onde as fases larvais completam-se ainda dentro do ovo. Estes ficam fixos ao abdômen da mãe através de um filamento. O número de ovos varia bastante, de 15 a 150. O tempo de incubação dos ovos é curto, de 8 a 12 dias.

Na eclosão são liberados indivíduos juvenis, já com características semelhantes ao adulto. Por vários dias (cerca de 10), os jovens são protegidos e carregados pelas fêmeas sob o abdome, caracterizando cuidado parental estendido. Nesta fase, os filhotes se alojam na mesma cavidade onde se localizavam os ovos. Desde o momento que as crias nascem, as fêmeas permanecem sempre submersas. A reserva de vitelo dura somente um dia, depois do qual os filhotes precisam se alimentar.


Muitos aquaristas argentinos relatam sucesso na reprodução em aquários desta espécie, inclusive em comunitários bem plantados. Porém, apesar da alta natalidade, a sobrevivência dos filhotes é moderada, não se sabe se decorrente de mortalidade, ou de predação entre os filhotes.








Sequência de desenvolvimento dos ovos de
Mikrotrichodactylus borellianus, inicialmente opacos, com coloração viva, e depois esbranquiçados, com os caranguejinhos visíveis no seu interior. A última foto mostra os bebês no pleon da mãe. Fotos de Walther Ishikawa.












Mikrotrichodactylus borellianus bebês, nascidos no aquário. Foto de Walther Ishikawa.

 


Cópula de Mikrotrichodactylus borellianus, imagem cedida por Valeria Castagnino.





Pequenos filhotes de Mikrotrichodactylus borellianus nascidos no aquário, ao longo do seu desenvolvimento. Veja a comparação com os caramujos Planorbídeos na primeira foto. Imagens cedidas por Valeria Castagnino.




Casal de Mikrotrichodactylus borellianus em aquário comunitário de invertebrados. A primeira imagem mostra o momento da cópula, e a segunda, o casal com a fêmea já carregando os filhotes. Fotos de Marne Campos.




Na primeira foto, uma fêmea de Mikrotrichodactylus borellianus com filhotes no abdomen, e na segunda foto, o filhote já crescido, dois meses depois. Fotos de Marne Campos.



Comportamento

 

São animais aquáticos, não necessitando vir à superfície para respirar. Porém habitam locais rasos, sendo vistos também em ambientes emersos próximo da água. Desta forma, fugas são bastante frequentes, o aquário deverá ser sempre mantido bem tampado.

São pequenos e pacíficos, com diversos relatos de sucesso na manutenção destes animais em aquários comunitários, em especial entre colegas argentinos. Podem ser mantidos inclusive com pequenos camarões, mas há controvérsia em relação a caramujos, com relatos de predação. Pelas suas pequenas dimensões, deve-se atentar somente ao risco de predação por outros animais. Pode se alimentar de plantas com folhas mais tenras.

Têm hábitos noturnos, especialmente os adultos, e costumam ficar entocados até anoitecer. Preferem aquários de fundo arenoso, com muitas tocas e esconderijos. Não se dão bem em tanques densamente plantados.

Como os demais crustáceos, tornam-se vulneráveis após a ecdise, e podem ser predados por outros animais. Por este motivo, nesta época permanecem entocados, até a solidificação completa da carapaça.

 



Mikrotrichodactylus borellianus, pequena fêmea em um aquário, fotos cedida por Hernán Chinellato. Note as finas cerdas no corpo e pernas do caranguejo.







Mikrotrichodactylus borellianus, pequena fêmea em um aquário. Imagem cedida por Hernán Chinellato.


Alimentação

 

Não são nada exigentes quanto à alimentação, comendo desde algas, animais mortos a ração dos peixes. Pelas suas pequenas dimensões, geralmente não oferecem risco a outros animais, exceto filhotes de caramujos, que são vorazmente predados.

 
 


Bibliografia:

  • Magalhães C. Famílias Pseudothelphusidae e Trichodactylidae. In: Melo GAS. Manual de Identificação dos Crustacea Decapoda de água doce do Brasil. São Paulo: Editora Loyola, 2003.
  • Collins PA, Giri F, Williner V. Population dynamics of Trichodactylus borellianus (Crustacea Decapoda Brachyura) and interactions with the aquatic vegetation of the Paraná River (South America, Argentina). Ann. Limnol. - Int. J. Lim. 2006, 42 (1), 19-25.
  • Montagna MC, Collins PA. Oxygen consumption and ammonia excretion of the freshwater crab Trichodactylus borellianus exposed to chlorpyrifos and endosulfan insecticides. Pestic Biochem Physiol 92(3):150-155 (2008).
  • Magalhães C, Türkay M. Taxonomy of the Neotropical freshwater crab family Trichodactylidae. I. The generic system with description of some new genera (Crustacea: Decapoda: Brachyura). Senckenbergiana Biologica, 75 (1/2): 63–95.
  • Williner V, Torres MV, Carvalho DA, König N. Relative growth and morphological sexual maturity size of the freshwater crab Trichodactylus borellianus (Crustacea, Decapoda, Trichodactylidae) in the Middle Paraná River, Argentina. ZooKeys, 2014; 457: 159–170.
  • Senkman LE. Biología reproductiva de cangrejos tricodactílidos del río Paraná Medio. Tesis de doctorado. Universidad Nacional de La Plata, Facultad de Ciencias Naturales y Museo, 2014.
  • Carvalho EAS de. Sistemática e revisão taxonômica dos caranguejos de água doce do gênero Trichodactylus Latreille, 1828 (Decapoda: Trichodactylidae) [tese]. Ribeirão Preto: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto; 2018.

 

 

Ficha escrita por Valeria Castagnino e Walther Ishikawa

 

Agradecimentos especiais a Valeria Castagnino (in memorian), moderadora do Fórum Argentino CRoA ( Club Rosarino de Acuaristas ), que escreveu este artigo em parceria conosco. Agradecimentos também a Hernán Chinellato (Argentina, também moderador do CRoA), Marne Campos, administrador do Portal AqOL ( Aquarismo OnLine ) e a Leonardo N. Scherer, que contribuíram com imagens e informações. Agradecimentos especiais também a Jonatas Rodrigues Encarnação, pela cessão dos exemplares de Valinhos (SP), e valiosas informações.




As fotografias de Walther Ishikawa estão licenciadas sob uma Licença Creative Commons. As demais fotos têm seus direitos autorais pertecendo aos respectivos autores.

 
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