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"Aegla schmitti"  
Artigo publicado em 03/11/2013, última edição em 21/04/2023  



Égla – Aegla schmitti

 

Nome em português: Égla, Caranguejo de Rio, Tatuí de água doce.
Nome em inglês: -
Nome científico: Aegla schmitti Hobbs III, 1979

Origem: Brasil, nordeste, leste e sudeste do PR, sudeste de SP e norte de SC.

Tamanho: carapaça com comprimento de até 3,8 cm
Temperatura: 11-18° C
pH: ácido

Dureza: média
Reprodução
: especializada, todo ciclo de vida em água doce
Comportamento: pacífico

 

Apresentação

 

Apesar de serem muitas vezes referidos como “caranguejos”, na realidade estes crustáceos pertencem a outra infra-ordem, Anomura, a mesma dos caranguejos-ermitões. A família Aeglidae possui somente um gênero atual, Aegla, exclusivo de ambientes dulcícolas da região sul da América do Sul, com próximo de 60 espécies brasileiras descritas (muitas foram descritas bastante recentemente, veja a lista completa e atualizada de espécie neste link ). São os únicos anomuros encontrados em água doce, exceto por uma única espécie de ermitão dulcícola de uma ilha do pacífico.

Não são muito populares no Brasil como animais de aquário, mas em outros países (como na Argentina) são criados há algum tempo com sucesso.

            Etimologia: Aegla vem da deusa mítica grega Aegle, uma das três Hespérides, donas do jardim dos pomos de ouro, situado no extremo ocidental do mundo. E schmitti é uma homenagem ao eminente zoólogo norte-americano especialista em decápodes, Waldo LaSalle Schmitt (1887–1977), que na sua viagem à América do Sul em 1942 realizou os primeiros estudos taxonômicos dos Aeglas, descrevendo nada menos que 17 novas espécies (7 delas ocorrem no Brasil).

 

Origem

            Églas são crustáceos com distribuição restrita à porção sul da América do Sul, vivendo em ambientes dulcícolas das regiões temperadas do continente, o que explica sua baixa tolerância ao calor. Vivem em riachos límpidos de leito rochoso, geralmente montanhosos, alguns também em lagoas e represas.

            O Aegla schmitti é uma espécie encontrada somente no Brasil, com uma faixa de distribuição ao longo da região nordeste, leste e sudeste do Paraná, com extensão para o sudeste do Estado de São Paulo, e norte de Santa Catarina, no bioma da "Mata Atlântica". Habita a bacia do Rio Paraná (Rios Paranapanema, alto Iguaçu, Paraná, Tibagi, Ivai, Timbó) e sistema Atlântico Sul (Rio Ribeira do Iguape). É a única espécie de Aegla encontrada em três estados brasileiros. 

Em São Paulo, é abundante no PETAR (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira), sendo a espécie mais comum e amplamente distribuída nos rios do parque. É encontrado tanto dentro quanto fora de cavernas, com sub-populações com adaptações morfológicas à vida subterrânea, sendo portanto considerado um cavernícola facultativo (troglofilia).

            



Distribuição geográfica de Aegla schmitti. Imagem original Google Maps; dados de Bond-Buckup G. 2003.

 


Aparência

 

Lembra bastante um caranguejo, com cefalotórax achatado, pernas dispostas lateralmente e primeiro par na forma de grandes garras (quelípodos). Entretanto, numa análise mais cuidadosa, destacam-se antenas finas e bastante longas, e abdômen relativamente desenvolvido, parecendo um lagostim com a cauda dobrada. O próprio cefalotórax é oval, novamente lembrando um lagostim achatado. Numa visão superior, só são visíveis três pares de pernas ambulatórias (ao invés dos quatro pares dos caranguejos), já que o último par é atrofiado, fica oculto sob o abdômen e não possui função locomotora.

A. schmitti é uma das maiores espécies de Aeglas brasileiros, atingindo 3,8 cm de comprimento de carapaça. Também é identificado com relativa facilidade devido à sua crista palmar muito grande e disciforme.


  • Rostro longo nos machos adultos, carenado em todo seu comprimento
  • Espinho ântero-lateral da carapaça ultrapassando a metade da córnea
  • Lobos protogástricos presentes. elevados
  • Ângulo látero-dorsal da segunda pleura com espinho
  • Crista palmar fortemente disciforme, escavada, principalmente na quela menor do macho
  • Dedo móvel do quelípodo com lobo encimado por tubérculos e escamas
  • Ângulo ântero-lateral interno do carpo do quelípodo obtuso, achatado, com tubérculo escamiforme
  • Margem interna da face ventral do ísquio com dois espinhos, um distal, outro proximal, e entre eles até dois tubérculos
  • Margem dorsal do mero com tubérculos escamiformes



 



Aegla schmitti, imagens gentilmente cedidas pela Dra. Setuko Masunari.



Parâmetros de Água

 

Todos os Aeglas habitam ambientes bastante estáveis, são bem sensíveis a variações e condições inadequadas de água. Um aspecto bastante importante é sua sensibilidade a altas temperaturas, uma causa comum de insucesso na sua manutenção em cativeiro. Somente como exemplo, o Aegla laevis sobrevive por 30 minutos a 28º C, e por 20 minutos a 31º C. Baseado nos sítios de coleta, a temperatura ideal desta espécie é bem baixa, em torno de 11-18° C.

Por viverem em água corrente e fria, demandam também alta taxa de oxigenação, sugerindo-se superdimensionar a filtragem e circulação de água no tanque. Como os demais crustáceos, são bem sensíveis a compostos nitrogenados, assim como a metais. Parece preferir águas mais ácidas que as demais espécies, o valor médio de pH dos sítios de coleta é 5,7.




Reservatório Carvalhinho, Mananciais da Serra, Piraquara (PR), habitat de Aegla schmitti. Foto cortesia de Érico Oliveira Teodósio.





Aegla schmitti
às margens de um riacho em São José dos Pinhais, PR. Vídeos cortesia de Marcos Santos.



Aegla schmitti fotografado nos reservatórios dos Mananciais da Serra, Piraquara (PR). Foto cortesia de José Carraro. A primeira imagem do artigo também é de sua autoria.

 

Dimorfismo Sexual

 

Bem demarcado, machos são maiores e possuem garras mais robustas e assimétricas (heteroquelia). Fêmeas possuem abdômen mais largo, e pleópodes mais desenvolvidos.




Aegla schmitti, fotografados na Furna do Buraco do Padre, Parque Nacional dos Campos Gerais, PR. Fotos de Henrique Simão Pontes (GUPE).




Reprodução

Possuem ciclos anuais de reprodução, o período reprodutivo da espécie ocorreu nos meses mais frios do ano (de abril a novembro), com os juvenis surgindo na primavera, estação seguinte ao período com maior intensidade de fêmeas ovígeras.

Produzem poucos ovos de grandes dimensões (até cerca de 200), apresentam desenvolvimento pós-embrionário direto, onde as fases larvais completam-se ainda dentro do ovo. Na eclosão são liberados indivíduos já com características semelhantes ao adulto. Os juvenis recém-eclodidos medem cerca de 2,0 mm. Églas apresentam o que se chama de Eclosão Assincrônica, ou seja, ovos de uma mesma ninhada eclodem de forma não-sincronizada. Por este motivo, as fêmeas carregam ovos em diferentes estágios de desenvolvimento, juntamente com juvenis.

É provável que esta espécie tenha também cuidado parental, mas não existem ainda informações.

 
 


Aegla schmitti, casal fotografado nos reservatórios dos Mananciais da Serra, Piraquara (PR), fêmea ovada na primeira imagem, e macho na segunda. Fotos cortesia de Érico Oliveira Teodósio.



Comportamento

 

São animais totalmente aquáticos, devem ser criados em aquários, não necessitando de uma porção emersa.

Apesar das grandes garras, não são animais agressivos, podendo ser mantidos com peixes ou com outros Aeglas, independente do sexo. Comportamento gregário, em especial animais juvenis. Hábitos noturnos, passando o dia entocado, saindo à noite para se alimentar.

Como os demais crustáceos, tornam-se vulneráveis após a ecdise, e podem ser predados por outros animais. Por este motivo, nesta época permanecem entocados, até a solidificação completa da carapaça.

A longevidade da espécie foi estimada em 34 e 38 meses (machos e fêmeas) para a população de SP, e 48 meses para PR, com dois ciclos reprodutivos durante a vida.


 

Aegla schmitti às margens de um riacho em São José dos Pinhais, PR. Fotos de Marcos Santos.



Alimentação

 

Não é exigente quanto à alimentação, na natureza são onívoros, se alimentando de detritos e material orgânico em decomposição, vegetal e animal.

 

 

Bibliografia:

  • Bond-Buckup G. Família Aeglidae. In: Melo GAS. Manual de Identificação dos Crustacea Decapoda de água doce do Brasil. São Paulo: Editora Loyola, 2003.
  • Martin, J.W. & Abele, L.G. 1988. External morphology of the genus Aegla (Crustacea: Anomura: Aeglidae). Smithsonian Contributions to Zoology 453: 1-46.
  • Bond-Buckup G, Buckup L.1994. A família Aeglidae (Crustacea, Decapoda, Anomura). Arch. Zool., São Paulo, 2 (4): 159-346.
  • Tudge CC. Endemic and enigmatic: the reproductive biology of Aegla (Crustacea: Anomura: Aeglidae) with observations on sperm structure. Memoirs of Museum Victoria 60(1): 63–70 (2003).
  • Trevisan A. Influência da Formação Serra do Mar na Biogeografia Ecológica das Espécies da Família Aeglidae Dana 1852 (Crustacea: Decapoda) no Estado do Paraná/Brasil. Relatório apresentado ao Instituto Ambiental Paranaense, como pré-requisito para renovação de licença de coleta - Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2010.
  • Teodósio EAFMO. Biologia de Aegla schmitti Hobbs III, 1979 (Crustácea, Anomura, Aeglidae) em reservatórios dos Mananciais da Serra, Piraquara, Estado do Paraná. Dissertação (Mestre em Ciências Biológicas, área de concentração Zoologia. Curso de Pós-Graduação em Ciências Biológicas, Zoologia) - Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2007.
  • Trevisan A, Masunari S. Geographical distribution of Aegla schmitti Hobbs III, 1979 (Decapoda Anomura Aeglidae) and morphometric variations in male populations from Paraná State, Brazil. Nauplius 18(1): 45-55, 2010.
  • Fernandes CS. Morfometria geométrica de populações subterrâneas e epígeas dos caranguejos de água doce do gênero Aegla Leach 1820, (Crustacea: Anomura: Aeglidae) no Vale do Ribeira, Iporanga, SP. Dissertação (Mestre em Ciências Biológicas, área de Ecologia. Curso de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais PPGERN) – Universidade Federal de São Carlos.  São Carlos, SP, 2011.
  • Trevisan A. Influência da Serra do Mar na Distribuição e Biologia de Aeglidae (Crustacea Anomura) na Porção Leste do Estado do Paraná. Dissertação (Doutor em Ciências Biológicas, área de Zoologia) – Universidade Federal do Paraná. Curitiba, 2013.
  • Chiquetto-Machado PI, Shimizu RM, Bueno SLS, Vieira LCM. Life cycle of the freshwater anomuran Aegla schmitti Hobbs, 1978 (Decapoda: Anomura: Aeglidae) from southeastern Brazil. Journal of Crustacean Biology, v. 36, p. 39-45, 2015.
  • Santos S, Bond-Buckup G, Gonçalves AS, Bartholomei-Santos ML, Buckup L, Jara CG. Diversity and conservation status of Aegla spp. (Anomura, Aeglidae): an update. Nauplius. 2017; 25: e2017011. 



Agradecimentos especiais aos zoólogos Dr. Érico Augusto Ferri Maranezzi Oliveira Teodósio e Dra. Setuko Masunari ( Laboratório de Ecologia de Crustacea - Universidade Federal do Paraná  ), aos espeleólogos Henrique Simão Pontes Laís Luana Massuqueto ( Grupo Universitário de Pesquisas Espeleológicas - GUPE ), ao fotógrafo José Carraro ( Mananciais da Serra ) e a Marcos Santos pela cessão das fotos e vídeo para o artigo.
 
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