Lagostim-de-água-doce
– Parastacus fluviatilis
Nome
em português: Lagostim-de-água-doce
Nome em inglês: -
Nome científico: Parastacus fluviatilis Ribeiro & Buckup, 2016
Origem:
Brasil (RS e provavelmente SC)
Tamanho:
até 9 cm
Temperatura: 12-21° C
pH: indiferente
Dureza: indiferente
Reprodução: especializada,
todo ciclo de vida em água doce
Comportamento: pacífico
Importante!!
O Parastacus fluviatilis não é mencionado nas espécies listadas como em risco na Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção
publicada em Dezembro de 2014 pelo Ministério
do Meio Ambiente (MMA), ou na lista de espécies do estado do Rio Grande do Sul, publicado pelo MMA em 2014. Porém,
um consenso de especialistas publicou um artigo avaliando o estado de
conservação dos lagostins sul-americanos (Almerão MP, et al. 2014), onde a espécie é mencionada na categoria IUCN "dados
deficientes" (DD). A página oficial do IUCN também lista esta espécie como DD. Desta
forma, a rigor, sua coleta e manutenção em cativeiro são legalmente
permitidas, mas sugerimos fortemente que não sejam feitas, dada a
escassez de informações sobre o real estado de conservação desta
espécie.
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Apresentação
Os Lagostins dulcícolas brasileiros
são um grupo bastante peculiar de decápodes, com particularidades que os tornam
bastante distintos dos Lagostins mais comumente encontrados como animais de
aquário. Existem cerca de dez espécies de Lagostins de água doce no Brasil, todos do gênero Parastacus. Embora sejam chamados de
“aquáticos”, na realidade são espécies escavadoras, que passam boa parte da sua
vida enterrada em tocas construídas em terrenos úmidos e alagados.
Têm uma distribuição bastante
restrita no país, sendo encontrados somente nas planícies do extremo
sul (estados de RS e SC, bem mais comum no primeiro), habitando
preferencialmente áreas pantanosas e margens de pequenos córregos.
Nestas seis espécies, existem dois padrões distintos de
comportamento e modo-de-vida: as espécies chamadas de “fossoriais”, que escavam
tocas profundas em locais pantanosos, vivendo em bolsões de água com baixa
oxigenação no fundo destas tocas; e as espécies que habitam locais marginais de
pequenos riachos de fraca correnteza, ocultos em meio aos detritos, raízes da
vegetação ciliar, ou escavando tocas mais superficiais.
O Parastacus fluviatilis pertence ao primeiro grupo (“fossoriais”), e é a espécie com distribuição mais ampla encontrada no Brasil. Possui grande importância ecológica, fazendo parte da
alimentação de diversos mamíferos e aves ribeirinhas, como lontras e cuícas.
Etimologia: O nome Parastacus vem do nome de outro
gênero de lagostins dulcícolas da Eurásia, Astacus (do grego αστακός, astacós, significa lagosta ou lagostim),
com o prefixo grego para (junto com, além de, alterado,
contrário). Os Parastacus eram originalmente classificados como Astacus.
E fluviatilis vem do latim fluvius (rio).
Origem
O Parastacus fluviatilis é
uma espécie de descrição recente (2016), encontrada no Brasil (estado de SC, e mais raramente no RS) e
Uruguai. Há um duvidoso relato de coleta no Norte da Argentina. São encontrados principalmente em ambientes lóticos das bacias dos rios da vertente atlântica.
Distribuição geográfica de Parastacus fluviatilis. Imagem
original Google Maps; dados de Ribeiro et al. 2016.
Aparência
Seu aspecto
lembra bastante os demais lagostins límnicos, com o corpo cilíndrico, primeiro
par de patas adaptadas na forma de robustas quelas, um abdômen longo e
musculoso terminando em urópodos dispostos em um leque caudal. Pernas
ambulatórias dispostas lateralmente, além das garras maiores, os dois primeiros
pares ambulatórios também possuem pequenas quelas.
Porém, uma
análise mais minuciosa mostra algumas adaptações para seus hábitos escavadores,
tendo um abdômen relativamente curto, devido à perda da sua importância como
estrutura locomotora. Os quelípodos são curtos e globosos, e os dáctilos se
movem em um plano vertical, para maior eficácia durante o processo de escavação
e transporte de material.
As chaves de identificação mais recentes sugerem excluir inicialmente P. varicosus e P. saffordi das demais, dado que ambas possuem três características peculiares. O P. fluviatilis e demais espécies brasileiras possuem estas características: extremidade anterior da carena pós-orbital não terminando em um espinho, aréola não delimitada por carenas, e lobo basal do exopodito dos urópodos sem espinho. Daí avalia-se a margem posterior do telso, arredondada na presente espécie. Segue-se a análise dos pêlos nos quelípodos, P. fluviatilis não possui pêlos no carpo distal
Cheliped dactyl and pollex cutting edges clearly visible
Daí a diferenciação do P. fluviatilis pode ser feita pelo aspecto dos quelípodos, P. saffordi possui pêlos longos, reunidos em tufos, cobrindo apenas a face interna dos dedos. A face ventral do ísquio do terceiro maxilópode com uma fileira longitudinal de tubérculos. Pelos pêlos nas quelas, pode ser confundido com as duas outras espécies brasileiras
com pêlos nas mãos, o P. laevigatus e P. pilimanus, mas com distribuição distinta nas quelas.
Seu rostro é alongado e lanceolado, dorsalmente plano. Limites da aréola assinaladas por elevações modestas e apenas na área anterior. Margem dorsal e ventral da palma convexas.
Parastacus fluviatilis, imagens gentilmente cedidas por Jefferson Souza da Luz. A primeira imagem do artigo também é de sua autoria.
Parâmetros
de Água
Habitam locais
variados, podem ser encontrados tanto em locais pantanosos e relativamente
distante de grandes corpos d´água (como o P.
defossus) quanto em margens de riachos (como o P. brasiliensis). Desta forma, são mais tolerantes a diferentes
parâmetros ambientais. Entretanto, como todos os demais Parastacus, são sensíveis a altas temperaturas.
Parastacus fluviatilis, foto de Jefferson Souza da Luz.
Dimorfismo Sexual e Reprodução
Todos os Parastacus
brasileiros são intersexuados, apresentando orifícios genitais masculinos e
femininos no indivíduo adulto, poro genital masculino no coxopodito do
pereiópodo 5, e poro feminino no coxopodito do pereiópodo 3.
O P. fluviatilis parece ter
intersexualidade permanente, mas existem poucos estudos. Pode haver
hermafroditismo sequencial, mas não há informações. Não há diferença no seu
aspecto externo, todos os indivíduos apresentando orifícios masculinos e
femininos no indivíduo adulto. Porém, com a dissecção e análise da anatomia
interna é possível a identificação de gônadas masculinas ou femininas (nunca as
duas).
Todos os lagostins têm
fertilização externa. Durante a cópula, o macho deposita seu espermatóforo na
superfície ventral da fêmea. Quando os oócitos maduros são liberados através
dos gonóporos femininos, o espermatóforo se dissolve e os espermatozóides ficam
livres. Os oócitos são então fertilizados externamente, e são agrupados em uma
massa que é fixada aos pleópodos por uma substância adesiva.
Produzem ovos de grandes
dimensões, apresentam desenvolvimento pós-embrionário direto, onde as fases
larvais completam-se ainda dentro do ovo. Na eclosão são liberados indivíduos
já com características semelhantes ao adulto, sem fase larval. Muito
provavelmente esta espécie mostra cuidado parental, os filhotes permanecem
fixos aos pleópodos da mãe, até ficarem independentes.
Parastacus fluviatilis, fotos de Jefferson Souza da Luz.
Comportamento
Não é uma espécie francamente fossorial como o P. defossus, mas possui um hábito
escavatório bastante exacerbado dentre os Parastacus
brasileiros. Constroem tocas complexas em áreas paludosas e alagadas, e
eventualmente em barrancos
marginais de riachos.
São galerias profundas, podendo
atingir até 2 metros de profundidade, descem até atingir o lençol freático,
terminando numa galeria com um bolsão de água maior. A periferia das aberturas
é freqüentemente elevada pela construção de torres cônicas ou chaminés
argilosas protetoras, que circundam suas aberturas, formadas por um acúmulo de
sedimento removido pelo lagostim durante a escavação. Entretanto, estas
chaminés parecem ter um papel também funcional, visando impedir o alagamento
excessivo das tocas com água das enchentes ou da chuva.
Como os demais crustáceos,
tornam-se vulneráveis após a ecdise, e podem ser predados por outros animais.
Por este motivo, nesta época permanecem entocados, até a solidificação completa
da carapaça.
Sendo uma espécie fossorial, é
bem provável que seja uma espécie pouco agressiva, possivelmente uma adaptação
evolutiva para seu modo de vida escavatório, muitas vezes com colônias de
vários indivíduos habitando uma mesma toca, em contraste com as demais espécies
de “águas abertas”.
Curso d´água onde foram localizados tocas de Parastacus fluviatilis, setor Amola Faca, Timbé do Sul, SC. Vale do Rio Araranguá. Imagens gentilmente cedidas por Jefferson Souza da Luz.
Alimentação
Estes animais são onívoros
oportunistas, sendo que a dieta consiste principalmente de detritos de origem
vegetal, em especial nestas espécies fossoriais, que pouco abandonam suas
habitações para procurar alimentos.
Parastacus fluviatilis, mostrando comportamento agonista. Fotos de Jefferson Souza da Luz.
Manutenção em cativeiro
Como já mencionado, o Parastacus fluviatilis não é uma espécie
listada na relação da fauna nativa ameaçada de
extinção, nacional ou estadual. Porém, uma avaliação feita por
um consenso de especialistas em 2014 considerou a espécie como sendo
"DD" (dados deficientes). No
Livro Vermelho do Uruguai, a espécie é classificada como Vulnerável (VU). Desta forma, sugere-se que esta espécie não
seja coletada na
natureza, ou criada em aquários.
Bibliografia:
- Ribeiro FB, Buckup L, Gomes KM, Araujo PB. Two new
species of South American freshwater crayfish genus Parastacus Huxley,
1879 (Crustacea: Decapoda: Parastacidae). Zootaxa. 2016 Aug 30;4158(3):301-24.
- Noro CK. A História natural
de Parastacus defossus Faxon, 1898 um lagostim fossorial do Brasil
meridional (Crustacea, Decapoda, Parastacidae). 2007. Tese (Doutorado em
Biologia Animal) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
- Rudolph E, Almeida A. On the sexuality of
South American Parastacidae (Crustacea, Decapoda). Invertebrate
Reproduction and Development. 01/2000; 37:249-257.
- Almerão
MP, Rudolph E, Souty-Grosset C, Crandall K, Buckup L, Amouret J, Verdi A,
Santos S, Araujo PB. (2015) The native South American crayfishes (Crustacea,
Parastacidae): state of knowledge and conservation status. Aquatic
Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems 25:10.1002/aqc.v25.2,
288-301.
- Rogers DC, Magalhães C, Peralta M, Ribeiro FB, Bond-Buckup G, Price WW, Guerrero-Kommritz J, Mantelatto FL, Bueno A, Camacho AI, González ER, Jara CG, Pedraza M, Pedraza-Lara C, Latorre ER, Santos S. Chapter 23 - Phylum Arthropoda: Crustacea: Malacostraca. In: Thorp and Covich's Freshwater Invertebrates (Fourth Edition), Editors: D. Christopher Rogers, Cristina Damborenea, James Thorp. Academic Press, 2020. p. 809-986.
Agradecemos ao colega Jefferson Souza da Luz pela cessão de fotos para o artigo.
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