Procambarus fallax (Hagen, 1870) f. virginalis
Importante!!
A
importação de todas as espécies de Lagostins estão proibidas pelo IBAMA, inclusive
o Marmorkrebs, com penas variáveis previstas por lei. Porém, há registros de
importações ilegais recentes de algumas espécies, incluindo esta, disponibilizando-as
em redes sociais, ou até mesmo em lojas. É importante lembrar que, além do
aspecto legal, o Marmorkrebs tem um potencial invasor extremamente alto, maior
ainda do que o Procambarus clarkii. Desta forma, sugerimos fortemente
que se evite a compra e criação desta espécie.
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O
Lagostim-Mármore é um animal misterioso de origem norte-americana, cuja
primeira aparição no comércio de animais de aquário foi na Alemanha, em meados
dos anos 90. Foram batizados de Marmorkrebs (alemão, “lagostim marmóreo”),
devido à sua característica padronagem de cor, com pequenas manchas irregulares
sobre um fundo de cor clara. Atinge cerca de 8 cm.
A
primeira menção em literatura científica data de 2002, mas somente em 2010 a
espécie foi identificada. Usando ferramentas morfológicas e genéticas, Dr.
Martin e colegas o identificaram como uma forma partenogênica do Procambarus
fallax (Hagen, 1870), propondo o nome científico de Procambarus fallax
f. virginalis. Desta forma, sua distribuição nativa presumida é a região
sudeste subtropical da América do Norte, Flórida e sul da Geórgia. Porém, é de
nota que nestas localidades, o P. fallax selvagem é gonocórico e com
reprodução sexuada. De onde surgiu esta variante partenogênica ainda é um
grande mistério.
São
lagostins bastante atípicos em dois aspectos: é o único crustáceo decápode que
se conhece que tem um padrão reprodutivo obrigatório por partenogênese
apomítica: só existem fêmeas, que geram ovos não-fertilizados, que se
desenvolvem em filhotes geneticamente idênticos à mãe (clones). Nenhum macho
foi identificado em laboratório, ou em populações introduzidas. E não se
conhecem populações selvagens desta variedade. Todas as populações conhecidas
em ecossistemas naturais são resultado de introdução humana.
Em 2003
foram identificados animais introduzidos na natureza na Europa, em 2009 em
Madagascar, e em 2010 no Japão. A via quase exclusiva de introdução na natureza
é a liberação intencional de animais de aquário. Sua bela aparência, robustez,
baixa manutenção, e facilidade de reprodução tornaram esta espécie bastante
atrativa para aquaristas. Porém, devido ao seu peculiar padrão reprodutivo,
frequentemente havia superpopulação em aquários, levando os criadores a
desprezarem o excesso de animais na natureza. Como agravante, são bastante
agressivos e destroem plantas, aumentando o risco de aquaristas desavisados
adquirirem esta espécie e se fartarem deles pouco após. Mesmo na natureza, o
potencial invasor desta espécie é elevadíssimo, um único animal liberado pode
gerar uma nova colônia. Cientistas de Madagascar (onde grandes populações
estabelecidas são encontradas) costumam chamar esta espécie de "O Invasor
perfeito".
Por
outro lado, poucas populações estabelecidas são encontradas na Europa (quase
todas na Alemanha, identificadas desde 2010, e raros focos nos Países Baixos,
Eslováquia e Suécia), apesar de múltiplos registros de indivíduos isolados
(além dos países citados, também na Itália). A explicação mais provável é o
clima, lembrando que é uma espécie subtropical, com uma tolerância baixa para
temperaturas mais frias. Neste aspecto, o clima do Brasil seria bastante
favorável para o estabelecimento de populações invasoras.
Antes
da proibição pelo IBAMA/MMA, ocorreram importações de diversas espécies de
lagostins exóticos para o Brasil, incluindo-se esta espécie. Há, pelo menos uma
importação bem documentada para o estado de Minas Gerais. Após a proibição, não
há registro de criação desta variedade, seja de filhotes de animais importados
naquela ocasião, seja por novas importações ilegais. Solicitamos a todos que se
atentem a esta espécie de lagostim, além do aspecto ilegal, pelo seu
elevadíssimo potencial invasor.
Nos
últimos anos, outra modalidade que tem crescido é a criação de Marmorkrebs como
alimento vivo, para grandes peixes carnívoros e tartarugas. Isto inclui a
criação em lagos e tanques ao ar livre, com maior risco de liberação. Assim
como o P. clarkii, existem registros de migrações do Marmorkrebs em
terra firme, o que contribui ainda mais para o potencial de dispersão desta
espécie.
Além da
questão direta envolvendo invasão, existe um importante agravante no
Marmorkrebs, que é o seu papel como vetor de doenças. Não há nenhuma evidência
direta de que o Marmorkrebs possa carrear o fungo Aphanomyces astaci,
agente da “praga do lagostim”. Mas é plausível considera-lo como um provável
vetor, dado que todas as espécies testadas de lagostins norte-americanos
mostraram-se capazes de agir como carreadores crônicos assintomáticos deste
germe. Pode carrear também o agente causador da Quitridiomicose (uma doença
grave de anfíbios), e também o WSSV (vírus da Doença da Mancha Branca, que
acomete camarões).
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Fábio Silva, Walther Ishikawa e Fernando Tsukumo |