Outros Besouros Aquáticos (3)
Besouros Estafilinídeos: (subordem Polyphaga, família Staphylinidae)
Chamados
em inglês de "Rove beetles", os besouros da família
Staphylinidae representam a maior família de besouros extantes, com
mais de 63.000 espécies conhecidas. São facilmente reconhecíveis,
através das suas asas anteriores (élitros) curtos, não recobrindo
a maioria dos segmentos abdominais, embora esta não seja uma
característica exclusiva desta família. Lembram "Tesourinhas",
mas sem a tesoura abdominal. Como esperado de uma família tão
grande, apresentam hábitos bastante diversificados, ocupando
praticamente todos os habitats onde são encontrados besouros.
Existem até espécies parasitóides, ectomutualistas de mamíferos e
outras vivendo em cupinzeiros e formigueiros. Porém, curiosamente,
não há nenhuma espécie verdadeiramente aquática. Mas muitas
subfamílias e gêneros se especializaram em viver em locais
marginais aquáticos, com raras espécies que ocasionalmente
submergem.
Estima-se
que 1% das espécies de Estafilinídeos sejam litorâneos, no Brasil,
é bem conhecido o gênero Bledius, diminutos
Estafilinídeos que vivem no litoral marinho, enterrados em praias
arenosas. No país há registros de pelo menos seis espécies
de Bledius (há 450 especies conhecidas, 20
marinhas), além de uma espécie do gênero Diglotta.
A
maioria dos Estafilinídeos é carnívora, tanto adultos quanto
larvas. Acredita-se que muitas espécies marinhas predem
microcrustáceos e larvas de insetos. Os Bledius parecem
ser exceção, alimentando-se de microalgas.
Os Bledius constroem
galerias na areia úmida, na região superior da praia junto à linha
de detritos trazidas pela maré, diretamente exposta ao sol. Trata-se
de um local que passa a maior parte do tempo seca, mas pode ser
recoberta pela maré alta. Constroem tocas superficiais (até 20 cm
de profundidade), reconhecíveis através de pilhas hemisféricas ou
traços sinuosos de areia seca aglutinadas na entrada. Locais com
densa população pode apresentar numerosos rastros, deixando a
superfície mole e pulverulenta. Podem atingir grandes densidades,
com registros de até 16.000 indivíduos por metro quadrado no verão.
Possuem entradas em "boca de garrafa", que dificultam a
inundação na maré alta, e que são facilmente ocluídos pelos
besouros adultos. Larvas e adultos são encontrados juntos, e algumas
espécies mostram cuidado parental. São atraídas pela luz em
grandes números.
Besouros Bledius cf. borzonei e Bledius cf. depressus, fotografados na praia Porto das Dunas, em Aquiraz, CE. Havia uma grande concentração de tocas na areia, próximo a um canal de água doce que ia em direção ao mar. Fotos de Walther Ishikawa.
Neste outro local, com maior depósito de matéria orgânica nas margens, os montículos de areia das tocas se destacava mais. Na segunda imagem, a entrada das tocas, e um diminuto besouro no centro da foto. Fotos de Walther Ishikawa.
Bledius sp.,
fotografados nas margens da foz do Rio Pacoti, em Aquiraz, CE. Note o
besouro da direita na última sequência de fotos, abrindo as asas e se
preparando para voar. Fotos de Walther Ishikawa. Besouro Staphylinidae ripário,
provável Stenus sp., fotografado nas margens de um riacho no Parque do Jaraguá, São Paulo, SP. Fotos de Walther Ishikawa.
Besouros Limniquídeos: (subordem Polyphaga, família Limnichidae)
Chamados em inglês de "minute marsh-loving beetles", Limnichidae é uma família de besouros encontrada em todos os continentes, 400 espécies no mundo, distribuídas em 30 gêneros. São besouros costais, tanto adultos como larvas são encontrados em terrenos úmidos junto a corpos d´água, muitas vezes enterrados no substrato. Ocorrem também em litorais marinhos, algumas espécies em locais inundados durante a maré alta. Provavelmente são herbívoros, mas as informações são escassas.
Adultos possuem o corpo oval e convexo, densamente pubescente, cobertos de curtos pelos escamiformes, medindo até 3 mm. Sua pubescência evidente sugere que talvez os adultos possam eventualmente submergir. Larvas com aspecto tipico de larvas coleópteras, pernas bem desenvolvidas, porém com o corpo relativamente curto, e também pubescente.
Limniquídeo Pelochares versicolor, exemplar ucraniano fotografado em Bezlyudivka, distrito de Kharkiv, Ucrânia. Foto de Boris Loboda.
Provável Limnichoderus, fotografado em uma lagoa em Santo Antônio do Pinhal, SP. Diminuto, media cerca de 2 mm, e caminhava habilmente na superfície da água. Fotos de Walther Ishikawa.
Tenébrios: (subordem Polyphaga, família Tenebrionidae)
Os besouros da família Tenebrionidae são bem conhecidos pelos aquaristas devido às espécies usadas como alimentos vivos, como o Tenebrio molitor, Tenébrio gigante (Zophobas morio) e o Besouro do amendoim (Ulomoides dermestoides). Trata-se de um grande grupo essencialmente terrestre, mais de 20.000 espécies de distribuição mundial, besouros adultos geralmente de cor escura (são chamados em inglês de Darkling beetle), larvas alongadas e cilíndricas, bastante esclerotizadas. Muitas espécies são pragas, como o Tribolium castaneum, uma das mais importantes praga de grãos estocados. O próprio nome "Tenebrio" é a designação feita por Linnaeus para os besouros pragas de trigo.
Alguns Tenébrios se especializaram em viver em litorais marinhos, no Brasil, é comum a espécie Phaleria testacea, descrita para quase todo o litoral brasileiro. Habitam praias arenosas próximo à linha da maré, passando parte do tempo submersos em água salgada. Suas tocas são comuns junto a carcaças de peixes e massas de algas trazidas junto com a maré. Possuem cor que varia do marrom e pastel, Podem formar grandes populações, chegando a incomodar banhistas que gostam de deitar na areia ou enterrar os pés.
Besourinho-de-praia Phaleria testacea, fotografados na praia Porto das Dunas, em Aquiraz, CE. Eram bastante numerosos, principalmente junto a carcaças e algas trazidas pela maré. Fotos de Walther Ishikawa.
Larvas de Phaleria testacea, encontradas enterradas junto aos adultos. Fotos de Walther Ishikawa.
Suas tocas na areia, e os adultos se enterrando. Fotos de Walther Ishikawa.
Outros Tenébrios habitam praias arenosas, mas longe da água, próximo à vegetação das dunas. Suas larvas produzem típicos rastros longos e superficiais quando formam túneis caminhando imediatamente abaixo da superfície da areia.
Tenébrio, provável Ammodonus, fotografados em uma praia arenosa em Porto das Dunas, Aquiraz, CE. Eram encontrados longe do mar, na região das dunas, no início da vegetação. Fotos de Walther Ishikawa.
Larvas de tenébrio, também provavelmente Ammodonus, fotografados junto aos besouros acima. Encontrados enterrados na areia fofa, formando túneis visíveis logo abaixo da superfície da areia. A última imagem mostra as larvas se enterrando. Fotos de Walther Ishikawa.
Besouros Sefenídeos, Centavo D´água: (subordem Polyphaga, família Psephenidae)
Larvas
de besouros da família Psephenidae têm um aspecto achatado
inconfundível, sendo chamados de “water pennies” em inglês (“penny” é o
centavo de Dólar, a menor moeda norte-americana, cunhada em cobre. A
tradução seria algo como “centavos d´água”). Besouros cosmopolitas (só
não foram registrados na Nova Zelândia), são conhecidas cerca de 280
espécies em 35 gêneros. Nove espécies brasileiras. Somente suas larvas são aquáticas, medindo cerca de 6 mm (adultos são ainda menores), possuem o corpo muito achatado e quase circular, com um aspecto segmentado que podem lembrar isópodes e também os extintos trilobitas. O
aspecto achatado das larvas permite um menor atrito com a correnteza.
Os adultos são menos achatados e cobertos por uma fina pubescência.
Mergulham na água para depositar seus ovos em rochas, pouco abaixo da
superfície. Larvas são encontrados comumente sob pedras ou entre as
folhas acumuladas nos riachos. Alimentam-se de matéria orgânica e algas
perifíticas em biofilmes, com hábitos noturnos. Algumas espécies têm um
estágio larvar bastante longo, podendo chegar a dois anos em uma
espécie australiana.
Larva de Sefenídeo, fotografado em um riacho catarinense. Fotos gentilmente cedidas por Jéssica Pires.
Larva
de besouro Sefenídeo, fotografado sobre uma rocha submersa em um rio no
PETAR (Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira), Iporanga, SP. Fotos
de Walther Ishikawa.
Besouros Ptilodactilídeos: (subordem Polyphaga, família Ptilodactylidae)
Uma família moderadamente grande, com cerca de 500 espécies, larvas de diversos gêneros da família Ptilodactylidae são aquáticos, geralmente encontrados em ambientes lóticos. Vivem em folhiço ou troncos submersos, alimentando-se destas folhas, madeira em decomposição e detritos. Tem aspecto alongado e semi-cilíndrico, esclerotizados e de cor acastanhada. Uma característica marcante das larvas é a presença de dois pequenos lobos com ganchos na extremidade do abdômen. Respiração aérea, através de um sifão espiracular na extremidade do abdômen. Existem gêneros terrestres e anfíbios. Larvas já foram coletadas em buracos de árvores na América Central. Há poucas informações, mas o tempo de desenvolvimento larval é estimado em cerca de três anos. Pupas se desenvolvem fora d´água, enterrados em meio a material vegetal em decomposição nas margens de riachos. Adultos terrestres, encontrados principalmente próximo a riachos. No Brasil, é encontrado o gênero Anchytarsus.
Larvas de Anchytarsus bicolor, fotografados em Raleigh, Wake County, Carolina do Norte, EUA. Este gênero também é encontrado no Brasil. Foto gentilmente cedida por Ali Iyoob.
Besouros Ptilídeos: (subordem Polyphaga, família Ptiliidae)
Conhecidos em inglês como “Featherwing beetles” (besouros asas-de-pena), os besouros Ptilídeos são os menores besouros conhecidos, a maioria não ultrapassando um milímetro. O menor besouro conhecido é uma espécie sul-americana do gênero Nanosella, mede 0,3 mm (pouco maior do que um paramécio unicelular), e vive nos túbulos de esporos de um fungo. O nome inglês é devido ao aspecto das asas posteriores, frangeadas com finas cerdas, lembrando uma pena de ave, ou flutuadores de sementes de Dentes de Leão. São diminutos besouros cosmopolitas, cerca de 600 espécies mais comuns em regiões tropicais e temperadas. É uma das famílias menos conhecidas de besouros, são pouco avistados devido ao seu diminuto tamanho e hábitos crípticos, e muitas espécies permanecem ainda não descritas. Vivem em habitats úmidos com material em decomposição, como serrapilheira, troncos podres, composteiras, fungos em decomposição, fezes de mamíferos, sob cascas de árvores, etc. São primariamente micetófagos, e estes locais propiciam o crescimento adequado dos fungos. Para o tema do nosso artigo, muitas espécies são encontradas em praias, em meio a algas marinhas em decomposição trazidas pela maré, como alguns Acrotrichis, Actidium e Actinopteryx. Outras habitam áreas marginais de riachos e lagos, ou em meio a musgos úmidos, como alguns Actidium, Ptenidium e Ptiliopycna. Recentemente foi descrita no Peru o gênero novo Phytotelmatrichis, habitando bolsões de água (fitotelmata) de zingiberales. Seus ovos são proporcionalmente bem grandes, podendo chegar à metade do comprimento das fêmeas, que geram somente um ovo de cada vez. Muitas espécies são partenogenéticas, e com rápido ciclo de vida. Há descrição também de polimorfismo em muitas espécies, em que cada sexo é representado por dois morfotipos, uma normal e outra forma vestigial onde olhos, asas e pigmentação corporal estão reduzidos ou ausentes. Ambas têm capacidade reprodutiva. Em condições normais as formas vestigiais são mais numerosas, representando mais de 90% dos indivíduos. Em condições adversas surgem as formas normais, capazes de dispersão para novos locais com melhores condições.
Minúsculo besouro Ptilídeo (seta vermelha na segunda foto), coletados e fotografados acidentalmente junto aos Phaleria testacea, em aglomerados de algas marinhas em decomposição. Fotografados na praia Porto das Dunas, em Aquiraz, CE. Fotos de Walther Ishikawa.
Besouro Ptilídeo Acrotrichis com suas asas estendidas, coletado nas Montanhas Sandias, Condado Bernalillo, Novo Mexico, EUA. Seu corpo mede 0,9 mm de comprimento. Foto de Edward L. Ruden.
A Bibliografia dos artigos sobre Besouros Aquáticos, assim como créditos fotográficos e agradecimentos pode ser vista aqui
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